sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Escritora Cecília Braga.




Câmara Aprova o Nome da Escritora Cecília Braga - Arquivo Folha de Dourado No. 121 de 06/11/1993

A Câmara de Vereadores aprovou, através do projeto de Lei assinado pelo plenário, o nome da escritora Cecília de Barros Pereira de Souza Braga para a Biblioteca Pública Municipal localizada no Departamento de Educação da Prefeitura Municipal. A indicação havia sido feita na penúltima sessão legislativa, pelo vereador Newton Romano Alves Costa, mas o projeto de Lei foi apresentado pela vereadora Angela Sciarretta, que por sugestão da mesa deixou a iniciativa para todos os colegas de legislatura.

Sobrinha do Presidente Washington Luiz e filha de um dos fundadores da cidade, o intendente Everardo Vallin Pereira de Souza, Cecília Braga é uma das principais testemunhas do crescimento e da história de Dourado. Autora de estilo rebuscado e detalhista, é, sem dúvida, um dos marcos da cultura do município. Nada se compara aos preciosismo como se dedica ao arquivo das suas memórias, um legado inestimável a história do município.

Esposa de Ben Braga, a escritora por muito tempo colaborou com a "Folha de Dourado" sempre mostrando um vocabulário invejável e colocações claras. Um problema na vista, segundo ela, tem impedindo uma colaboração mais constante, mas na edição histórica do final da marcha dos três cavaleiros de Dourado ela voltaria a colaborar, através de um artigo enaltecendo Malheirinho, o organizador da marcha.


EVOCAÇÃO

Folha de Dourado, N.o 56 de 09/05/1992.

De um modo despretensioso, o objetivo e ao mesmo tempo, encantador, Cecília de Barros Pereira de Sousa Braga registra os usos e costumes nas antigas fazendas em um livro que acaba de lançar: "EVOCAÇÃO". Descendente de ilustre estirpe, trazendo no sangue, na postura, nos gestos, na graça das atitudes a finura e a classe de uma verdadeira brasileira bem nascida, a autora quis homenagear na obra seus antepassados e contar como pensavam e viviam os antigos Barões do café. A ação desenrola-se no Vale do Paraíba, começando no último decênio do século XVIII, quando se rasgava o Caminho Novo, à margem da qual iam nascendo núcleos de população: São João Marcos, Passa Três, Pouso-Seco, São José do Barreiro, Bairro do Sant'Ana do Paraíba, Bairro do Bocaina, Embau. Pelas trilhas dessas circunvizinhanças, chegava-se a Capela do Senhor Bom Jesus do Livramento do Bananal. Em Torno, havia opulentas propriedades, cujas casas grandes foram lentamente destruídas pelo tempo, conservando contudo, algo da grandeza antiga nos portais trabalhados, nas escadarias nos jardins invadidos pelo mato.

Na Fazenda São João do Remanso acontecem os fatos que Cecília evoca com tanta emoção e nitidez, transportando o leitor para a época dos últimos grandes senhores de imensas glebas, cultivadas pelos escravos, retratados com piedade e carinho.

Os capítulos vão fluindo como as águas mansas de um riacho: ora, são as atividades do homem do campo, a lida com o gado e a lavoura, o trabalho duro e sofrido dos negros, o labutar das mucamas nas rocas e teares ou junto aos tachos nas cozinhas imensas.

Há páginas de muita beleza como a Festa de São João, com a fartura de doces de abóbora, batata doce e cidra, colocados em longos tabuleiros; os pés-de-moleque e as rapaduras embrulhadas em palhas de milho, as danças e cantorias dos escravos, no terreiro. Antes de anoitecer, tílburis, caleças, landôs, coches, vitórias e troles trazendo os convidados, adentrando a fazenda, cujo casarão ficava repleto de convidados. Do teto da imponente sala, destacavam-se as pinturas a ouro. Simétricos dunquerques em recurvada forma barroca sustentavam os espelhos em molduras douradas, com suas folhas de louro entrelaçando as iniciais da família.

A fartura transbordava em doces como alfenís, balas de ovos, cones de fios de ovos e ainda, no vinho do Reino e Xerez, servidos em cálices de cristal sobre pesadas salvas de prata. Depois eram as danças ao som de esmerada orquestra. No terreiro, o batucar dos negros ia até alta madrugada. "Negro há de batucá/ Até o dia dispontá/ Até o dia clareá/ Até o astro-rei nascê".

O livro é todo ele, um vigoroso libelo contra a escravidão e, ao mesmo tempo, um hino de exaltação ao ideal abolicionista.

Todo aquele universo é puro passado . Mas visitando a região, pôde Cecília hospedar-se no antigo solar da família, agora transformado em hotel. Os móveis barrocos, as portas com maçanetas de cristal facetado e bandeiras em arco, o assoalho de tábuas largas, os lustres cujas mangas bordadas se abriam em tulipas, tudo parecia evocar ainda os velhos tempos.

A obra é ainda enriquecida da transcrição de alguns cantos afro-brasileiros e de vocabulário de origem tupi, usado no texto, como coivara, pitanga, urutau, xororô, entre muitos outros.


"Evocação" é uma jóia delicada e bem trabalhada, num relicário de mil lembranças. Merece ser lido com muito carinho pelos que amam sua terra e sua gente.

C. Siqueira Farjallat.